O Brasil comemora hoje, 20 de novembro de 2020, o Dia Nacional da Consciência Negra. Um marco importante na luta pela igualdade racial em nosso país, que se estabeleceu há cerca de 50 anos, no intuito de resgatar a história, os valores e a contribuição dada por tantos seres humanos negros e negras, em direção à conquista de um espaço sociocultural mais justo e igualitário. Hoje, in memorian de tantos seres torturados e abatidos com requintes de crueldade, cabe-nos reiterar que a atrocidade humana realmente não reconhece limites e nos serve de alerta para que essas práticas extremas não sejam legitimadas de forma desengajada por quaisquer grupos ou sobre quaisquer pretextos.
A meu ver, a causa dos negros brasileiros não se restringe a uma tonalidade de pele, pois diz respeito a todas e a todos os membros de nossa nação, a uma sociedade que tolera ou não tolera atitudes que inflijam dor e sofrimento psíquico a uma pessoa ou grupo de pessoas meramente por uma questão racial. Considero, porém, que estamos em evolução, mesmo perante a existência de um contra fluxo de ações que demarcam exclusividade de direitos e rechaço da diversidade. Pensar numa sociedade justa e plural é pensar num conjunto de ações que não perpetuem práticas desumanas e que possa estimular movimentos que integrem uma diversidade de seres e expressões culturais que coexistem em nossa sociedade. Não é decerto uma tarefa fácil, mas necessária. E a demarcação de um Dia Nacional da Consciência Negra vem nos convidar a refletir sobre o valor do humano e sobre como nós brasileiros, em nossas práticas cotidianas, estamos contribuindo para validar ou não uma mudança nos ditames sociais que legitimam a desigualdade, o racismo e a discriminação social da população afrodescendente. São pequenas ações cotidianas que servem de lastro para os avanços sociais em prol de uma sociedade mais humana que integre direitos e deveres de modo mais equânime.
Por isso, no dia de hoje, dirijo um apelo a cada um dos nossos colegas de profissão, docentes, pesquisadores e psicoterapeutas, particularmente aos membros e simpatizantes da FBTC, para contemplarem essa importante questão social de coração aberto, sem arestas, identificando em seu contexto de atuação como poderá contribuir e fazer a diferença para a construção de parâmetros mais humanizados de convivência social.
Encerro aqui com uma menção especial a dois brasileiros afrodescendentes que superaram as limitações impostas pela discriminação racial e contribuíram enquanto pesquisadores para nossa sociedade. Um deles, o gaúcho Oliveira Silveira, poeta, professor e pesquisador afrodescendente, que resgatou a história do negro brasileiro e colaborou para que fosse instituído o dia comemorativo de hoje, e o psiquiatra baiano Juliano Moreira, que desbravou no Brasil uma área restrita aos brancos, superando preconceitos e demarcando a história da psiquiatria, contribuindo para o movimento de reforma e humanização dos manicômios brasileiros.