Sobre o Homenageado
Bernard, o protagonista
Por Eliane Mary de Oliveira Falcone e Helene de Oliveira Shinohara
Nos últimos 20 anos, pode-se observar um importante crescimento terapia cognitivo-comportamental (TCC) no Brasil. Este crescimento ocorreu, em parte, pela profusão de pesquisas em todo o mundo atestando a eficácia dessa abordagem, o que a levou ao status de tratamento de referência pela Organização Mundial de Saúde (Dobson e Dobson, 2010).
Outra razão para isto acontecer se deveu ao empenho de muitos profissionais brasileiros dedicados a divulgar a teoria e a prática da TCC através de ensino em universidades, publicações, organização de eventos e de cursos de extensão ou de especialização. Dentre esses, destaca-se Bernard Pimentel Rangé como o protagonista do movimento cognitivo-comportamental do Brasil.
Filho de mãe baiana e pai parisiense, Bernard nasceu em São Paulo, no ano de 1945, mudando-se com a família para o Rio de Janeiro aos cinco anos de idade. Em 1971, graduou-se em Psicologia na PUC-Rio. Seu interesse pela terapia comportamental surgiu por influência de um professor, Otávio Soares Leite, que o levou a conhecer os trabalhos de Joseph Wolpe sobre dessensibilização sistemática (Falcone e Rangé, 2014).
Com a entrada de Myriam Vallias na PUC-Rio, recém-chegada da Pensilvânia, Bernard teve a oportunidade de praticar as técnicas comportamentais e verificar a sua eficácia em seus clientes. Ainda nesta época, Bernard participou da II Reunião da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), ocorrida em Ribeirão Preto, em outubro de 1971, onde conheceu figuras ilustres da análise do comportamento, como João Cláudio Todorov e Thereza Mettel, sendo esta última sua orientadora no mestrado concluído em 1975. Durante os anos 1990, junto com um grupo de terapeutas do Rio de Janeiro, começou a aprofundar os estudos sobre terapia cognitiva no tratamento da depressão, da ansiedade e da personalidade (Rangé, Falcone e Sardinha, 2007). Em 2001 concluiu o doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) (Falcone e Rangé, 2014).
Bernard iniciou a sua carreira docente na PUC em 1972, onde foi Coordenador da Graduação do Serviço de Psicologia Aplicada e Diretor do Departamento de Psicologia da PUC-Rio no período de 1981 a 1985. Ingressou por concurso como professor da UFRJ e posteriormente como docente do PPG desta mesma universidade (Shinohara, entrevista em 2003). Sua experiência como professor, pesquisador e orientador de pesquisas de mestrado e doutorado foi fundamental na formação de muitos profissionais, mestres e doutores (Falcone e Rangé, 2014).
Em parceria com Harald Lettner, Bernard foi o primeiro a organizar um livro intitulado Manual de Psicoterapia Comportamental, editado no Brasil em 1989 pela Manole, o qual recebeu a contribuição de vários autores brasileiros e do exterior. Posteriormente, em 1995, ele organizou dois volumes intitulados Psicoterapia Comportamental e Cognitiva, editados pela Editorial Psy e posteriormente pela Artmed. Em 2001, organizou uma obra intitulada Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais. Um diálogo com a Psiquiatria (Artmed). O sucesso foi tão grande que uma segunda edição ocorreu em 2011, com novos temas. Outro livro de autoria de Bernard de grande projeção foi Vencendo o Pânico (Rangé e Borba, 2008), publicado pela Editora Cognitiva, em uma versão para o terapeuta e outra para o paciente. Uma quantidade de artigos publicados em periódicos científicos constituiu também importante contribuição para a comunidade científica brasileira.
Sempre na busca de divulgar e fortalecer a terapia cognitivo-comportamental no Brasil, Bernard liderou a fundação, em 1991, da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental (ABPMC), que proporcionou o início de uma grande interlocução entre profissionais de várias cidades do Brasil. Com a contribuição de alguns colegas do Rio de Janeiro, organizou o I Encontro Brasileiro de Psicoterapia e Medicina Comportamental, ocorrido em 1992 na UERJ (Rangé e Guilhardi, 1995). Foi também membro fundador da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC), em 1998. Sua habilidade em estabelecer contatos profissionais o levou para além dos encontros brasileiros. Assim é que, em 2003, tornou-se presidente da Associação Latino-Americana de Terapias Cognitivas (ALAPCO), repetindo o seu mandato em 2011. Dentre os vários congressos organizados por Bernard e seus colegas, os mais expressivos ocorridos no Rio de Janeiro foram o V Latini Dies (1999) e o congresso da ALAPCO (2012).
A contribuição de Bernard para o fortalecimento da TCC no Brasil e para a produção de conhecimento na área encontra-se além do conteúdo desse texto. Sua popularidade e carisma não resultam apenas desse currículo incomparável. Virtudes como “empreendedor”, “generoso”, “amigo” etc., atribuídos carinhosamente a ele por colegas, contribuem para que este seja unanimidade entre profissionais renomados, tanto no Brasil quanto no exterior.
Bernard foi merecidamente homenageado em 2001 no congresso da ABPMC e em 2013, no congresso da FBTC. Além disso, mesmo com todos esses méritos constantemente reconhecidos, ele tem a grandeza de se deslumbrar com os trabalhos de colegas, tal como um jovem estudante que está começando a se familiarizar com os novos conceitos da TCC. Uma frase muito peculiar de Bernard é: “Você precisa conhecer o trabalho de fulano. Ele é sen-sa-cio-nal!” Essa grandeza, aliada a uma energia impressionante de quem está sempre disposto a aprender é que o torna único.
Essas são as razões pelas quais o consideramos como o protagonista da história da TCC no Brasil. E todos nós que o conhecemos somos unânimes em dizer que ele é sen-sa-cio-nal!
Referências:
Dobson, D. & Dobson, K.S. (2010). A terapia cognitivo-comportamental baseada em evidências. Porto Alegre: Artmed.
Falcone, E.M.F. & Rangé, B.P. (2014). O desenvolvimento da terapia cognitivo-comportamental no Rio de Janeiro. Disponível em www.atc-rio.com.br.
Rangé, B.P., Falcone, E. M. O. & Sardinha, A. (2007). História e panorama atual das terapias cognitivas no Brasil. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 3, 53-68.
Rangé, B. & Guilhardi, H. (1995). História da psicoterapia comportamental e cognitiva no Brasil. Em: B. Rangé (Org.). Psicoterapia comportamental e cognitiva. Pesquisa,prática, aplicações e problemas (pp.55-69). Vol. 2. Campinas: Editorial Psy.
Shinohara, H. (2003). Conversando com Bernard Rangé. Paralelo Digital Produções audio-visuais.
Sobre o Prêmio
(1) Reconhecer as inúmeras contribuições do Prof. Bernard Rangé para o desenvolvimento da pesquisa e clínica em Terapias Cognitivas e Contextuais em nosso país.
(2) Promover e incentivar jovens pesquisadores que revelem originalidade/inovação e relevância no desenvolvimento de estudos em Terapias Cognitivas e Contextuais no Brasil.
Desde sua primeira edição, O Prêmio Bernard Rangé ocorre como uma premiação especial dentro do Congresso Brasileiro de Terapias Cognitivas (CBTC). Até 2019, o Prêmio ocorria a cada dois anos, seguindo a frequência bienal do CBTC. Desde 2021, passou a ter edições anuais, acompanhando a nova periodicidade do CBTC.
O Prêmio é monográfico, sendo premiado um trabalho em cada uma das cinco categorias distintas, a saber:
Pesquisa em nível de Iniciação Científica.
Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação.
Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-Graduação latu sensu.
Dissertação de Mestrado.
Tese de Doutorado.